Coletivo australiano mira jogos adultos e ignora problemas mais graves

Uma reflexão sobre os esforços de terceiros sedentos por afundar a indústria dos games

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A Collective Shout exige das crianças algo que nem sequer possui coragem de fazer em relação aos jogos de azar. Chega a ser hilário como uma iniciativa que, à primeira vista, deveria ser moralmente louvável — ao buscar impedir que crianças tenham acesso precoce a conteúdos sexualizados — acabou sendo interpretada como algo nefasto.

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Propagada pela australiana Melinda Tankard Reist, conhecida por sua luta em defesa das mulheres e meninas, essa campanha vem causando desconforto dentro da comunidade gamer. Tudo isso porque o movimento tenta forçar operadoras de cartão de crédito a bloquearem transações de qualquer jogo com conteúdo adulto de teor libidinoso.

Sim, é importante que crianças não tenham contato com conteúdos de sexualização — seja nos games, músicas, filmes, desenhos ou qualquer outro meio. Contudo, a questão central é: como isso está sendo feito?

Hoje, plataformas renomadas já oferecem filtros por idade e controle parental. A Steam, que foi o principal alvo da ação, por exemplo, não exibe jogos adultos por padrão. Me recordo de que, por muito tempo, nem sabia que esse tipo de conteúdo existia na loja, até perceber que era necessário configurar manualmente o filtro de idade para liberar qualquer título sem censura.

Além disso, ao acessar sem login, a própria plataforma já bloqueia automaticamente páginas com esse tipo de conteúdo, exibindo uma mensagem de restrição. Isso significa que existe sim um sistema de controle, tanto para menores quanto para adultos. Ou seja, essas empresas já demonstram claramente que não querem expor menores a conteúdos impróprios.

Página jogo Steam
Página na plataforma Steam exigindo autenticação em um jogo considerado de conteúdo adulto.

É natural que, na puberdade (geralmente entre os 10 e 14 anos), a curiosidade e as sensações se aflorem. No entanto, o interesse precoce por conteúdos sexuais está muito mais ligado ao ambiente de criação e à exposição inadequada do que a uma regra biológica.

O mais preocupante é que, em um primeiro momento, o movimento conseguiu impor suas exigências a algumas operadoras. Não porque as empresas concordam com os argumentos, mas porque acabam cedendo à pressão de pessoas leigas que desconhecem a realidade dos jogos e embarcam na narrativa errada. Para esses, parece que basta entrar em uma página e já se depara com algo explícito, como se tudo estivesse exposto “em posições de quinze para as três”.

Até Peppa Pig seria banida

Se essa onda continuar, hoje serão os jogos adultos com apelo sexual, amanhã os de survival horror, FPS, ação ou qualquer outro gênero que, segundo eles, estimule reações violentas. Vai chegar o ponto em que só será permitido jogar algo no estilo Patati Patatá — e olhe lá, porque nem Peppa Pig escaparia, já que muitos acham que ela responde demais aos pais (risos).

Daddy Pig Fixes The Computer 🖥️ | Peppa Pig Official Clip

Para a instituição, fica fácil avançar quando muitos jogadores sofrem da chamada “síndrome de Peter Pan”, e se limitam a reclamar nas redes sociais, em vez de denunciar formalmente às autoridades ou assinar petições para investigação sobre a coação imposta por esse tipo de grupo.

Sim, repito: é grave o acesso precoce à sexualização por parte de crianças. Mas por que pessoas como Melinda, que dizem se importar tanto com a educação infantil e se intitulam terapeutas, não demonstram a mesma preocupação com o vício em jogos de aposta?

Hoje, há aplicativos baseados em mecânicas de pachinko — popularmente chamados de “jogo do tigrinho” no Brasil — impulsionados por campanhas publicitárias de criadores de conteúdo, cujos mascotes (como o próprio tigre) viralizaram. Muitos desses apps têm origem chinesa e operam de forma obscura. Há estudos (você pode encontrar artigos em repositórios como PubMed, Scielo ou bases como JSTOR) que mostram como jogos de azar levam pessoas ao vício, dívidas, venda de imóveis e até à falência—; em casos mais extremos de sua própria vida.

Busquei nos perfis da própria Melinda alguma manifestação semelhante sobre a tentativa de proibir que operadoras processem pagamentos de casas de aposta — e não encontrei. No Brasil, já existe uma legislação que tenta regular esse tipo de atividade, inclusive proibindo o uso de cartão de crédito. Mesmo assim, os apps continuam operando via Pix e outras formas criativas. No exterior, as empresas ainda atuam com mais liberdade, embora alguns países tenham aumentado a regulamentação.

A verdade é que a Collective Shout e sua mentora evitam tocar nesse ponto porque sabem que a indústria dos jogos de aposta é um campo mais complexo e menos “popular” para ganhar engajamento. Por outro lado, atacar o setor de games — que já aplica filtros e oferece controle parental — se torna um alvo mais fácil. Nenhuma plataforma é culpada se um pai ou responsável permite que uma criança crie contas falsas e minta a idade, o que em diversos países civilizados é considerado crime.

A revolta da CD Projekt Red

Se a comunidade gamer permanecer em silêncio, corremos o risco de ver a indústria dos jogos ser desmantelada por decisões questionáveis. Já enfrentamos uma crise que enfraquece o setor; agora, ainda teremos que lidar com tentativas de limitar o acesso dos jogadores. Hoje começa no PC, amanhã será nos consoles, depois nos celulares — e o que era diversão para aliviar o estresse do dia a dia pode se tornar cada vez mais inacessível.

Como forma de protesto, a CD Projekt Red liberou 13 jogos gratuitos entre os dias 1º e 3 de agosto, demonstrando coragem ao enfrentar essa tentativa de censura. Qualquer pessoa, dentro das permissões de idade, que acessasse a página de resgate e utilizasse o código ‘freedomtobuygames‘ conseguia resgatar títulos selecionados cuidadosamente pela curadoria — até Postal 2 estava entre os disponíveis. A desenvolvedora polonesa, criadora de franquias como The Witcher e Cyberpunk 2077, percebeu há tempos que a luta precisa começar antes que seja tarde demais. Se não reagirmos agora, o futuro dos games pode entrar num limbo profundo e perigoso — e, de lá, pode ser quase impossível sair.

Jefão Calheiro
Jefão Calheiro
Apaixonado por games, filmes de ficção científica, séries e tudo que envolve tecnologia e inovação, com mais de 15 anos de experiência comentando e analisando esses temas. Além disso, sou curioso por astronomia e, nas horas vagas, tento observar o cosmos como um astrônomo amador. Acredito no poder das opiniões e no respeito à diversidade de pensamentos. Em minhas análises, busco compartilhar conhecimento de maneira clara e acessível, ajudando o público a se conectar com as novidades do mundo do entretenimento e da tecnologia. Ah, e como bom flamenguista, vibro junto com o maior clube brasileiro, o Flamengo! Vamos, gamernéfilos, porque todo dia tem novidade nesse universo em constante expansão. =)

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